Autoria: Karen Alvarenga Windham-Bellord
Fonte: Valor Econômico - 14/09/2010
Depois de ler inúmeros artigos criticando ou elogiando o relatório do deputado Aldo Rebelo que propõe a revisão do Código Florestal, em andamento no Congresso Nacional, me veio à cabeça a célebre frase com a qual Bill Clinton praticamente venceu as eleições presidenciais de 1992 nos Estados Unidos: "It is the economy, stupid!"
A questão mais importante na discussão da reforma do Código Florestal não é o meio ambiente ou a avidez de produção do agronegócio, mas a necessidade de dados econômicos.
As sugestões de alteração na legislação florestal constantes no relatório mencionado introduziriam maior "flexibilização" legal, ao possibilitar anistia para aqueles que promoveram desmatamentos ilegais ocorridos até julho de 2008 em áreas de preservação permanente; inexistência de obrigação de instituir e manter reserva legal para imóveis com até quatro módulos fiscais; estabelecimento da competência dos municípios para autorizar desmatamentos; e necessidade de os estados realizarem Programas de Regularização Ambiental como condição essencial para que se possa exigir dos proprietários a recuperação das áreas por eles degradadas.
Todas essas modificações parecem favorecer os proprietários rurais, ansiosos para expandir a fronteira agrícola na Amazônia, no Cerrado e em outras áreas de interesse ambiental. Dessa forma, eles produzirão e exportarão mais grãos ou carne.
Os ambientalistas se encontram nervosos e pasmados com a falta de dados científicos referentes aos impactos negativos dessas mudanças nos biomas brasileiros. Eles têm se manifestado contrariamente à "falta de senso" da revisão do Código Florestal em artigos científicos e jornalísticos, cartas, entrevistas, blogs e networks sociais.
Todavia, ainda não houve um debate informado por elementos referentes à economia ecológica e aos ativos e passivos ambientais que serão criados nos setores da economia brasileira devido a tais mudanças na legislação florestal.
Há 20 anos, economistas vêm realizando estudos sobre a valoração da biodiversidade, desenvolvendo indicadores e fórmulas para calcular quanto custaria, por exemplo, a perda de nascentes que fornecem água potável para comunidades locais e a perda de polinizadores para a agricultura local devido à destruição de habitats. Outra grande utilidade de tais pesquisas é informar tomadores de decisões entre diferentes formas de utilização da terra. Uma maneira de decidir se os empreendimentos valem a pena economicamente é realizar um cálculo básico sobre a realização de empreendimentos econômicos em substituição a ecossistemas saudáveis. Assim, adiciona ao valor gerado pelo serviço ambiental, o valor necessário para a recuperação de tal serviço caso ele seja destruído pelo empreendimento, subtraindo o valor gerado pelo empreendimento em prol da sociedade. Se o resultado final for positivo, o empreendimento não deverá ser realizado. Se o resultado for negativo, o empreendimento é viável economicamente.
Conforme o relatório sobre a economia dos ecossistemas e da biodiversidade para formadores de políticas nacionais e internacionais (TEEB, 2009), um exemplo famoso dessa estimativa foi a decisão política de proteger e restaurar as bacias hidrográficas de Catskill e Delaware, principais fornecedores de água potável para a cidade de Nova York. A prefeitura, entre outras medidas, reservou US$ 300 milhões por ano até 2017 para adquirir propriedades próximas às bacias e conter o desenvolvimento econômico que causa enchentes e poluição. A análise de custo-benefício se concentrou em apenas um serviço prestado pelo ecossistema, qual seja, o valor gerado pelo fornecimento de água potável através da filtragem realizada pelos mananciais e economizou para a cidade cerca de US$ 6 bilhões que teriam sido gastos na contratação de serviços de purificação da água, caso as atividades de degradação continuassem.
Investir em recursos naturais torna-se ainda mais vantajoso se for considerada a multiplicidade de serviços prestados por ecossistemas saudáveis, tais como, regulação do clima, prevenção de riscos ambientais e produção de fibra e alimentos.
Após o desastre do tsunami, em 2004, no sul da Tailândia, por exemplo, há considerável interesse na não destruição, reabilitação e restauração de manguezais que antes serviam como barreiras naturais contra tempestades costeiras e que haviam sido substituídos por outras atividades.
Assim, no sudoeste da Tailândia, os órgãos ambientais decidiram por não aprovar uma indústria de camarão que seria localizada em um manguezal porque, ao fazerem as contas, chegaram à conclusão de que os benefícios econômicos advindos da preservação do manguezal eram maiores que os ganhos que a indústria de camarão proporcionaria. Ou seja, os valores que seriam gastos pelo poder público para construir proteções artificiais contra tempestades e substituir as rendas geradas para as comunidades locais seriam muito maiores que os valores gerados pela empresa de camarão com tributos e empregos.
Voltando ao Brasil, as áreas protegidas na Amazônia, conforme elucidam Portela e Rademacher (2001), por meio de seus serviços ambientais, geram benefícios locais e nacionais que ultrapassam 50% do que é obtido com atividades de agriculturas familiares. Amend (2007) também conclui em seus estudos que se as áreas protegidas na Amazônia fossem substituídas por pecuária extensiva, haveria uma geração de receita três vezes menores que os valores gerados com a preservação de tais áreas.
Assim, para que os políticos tomem uma decisão acertada em relação à melhor legislação florestal, seriam necessários a identificação dos serviços prestados pelos ecossistemas brasileiros a serem degradados e o cálculo de quanto custaria para restaurar tais serviços. Vários estudos pelo mundo afora em relação às áreas florestais concluíram que os benefícios advindos de ecossistemas protegidos superam em muito o custo de protegê-los e o custo de substituir alguns dos serviços prestados pelo ecossistema por serviços fornecidos por empresas públicas e privadas.
Niciun comentariu:
Trimiteți un comentariu